Na Justiça do Trabalho, o empregado tem sempre razão?

Na Justiça do Trabalho, o empregado tem sempre razão?

Desde a faculdade de Direito, ouvimos falar do paternalismo da Justiça do Trabalho e da cultura que se construiu em volta da lógica de que o trabalhador é a parte mais fraca da relação e precisa ser protegido.

Dentre os empresários, não é raro ouvir reclamações a respeito do assunto e a grande maioria é bastante pessimista sobre as chances de ganho em uma Reclamação Trabalhista.

Mas a verdade é que os julgamentos, na Justiça do Trabalho, estão cada vez mais técnicos e muito longe de uma proteção irrestrita ao trabalhador.

É o que demonstra o Relatório Geral da Justiça do Trabalho, divulgado, por último, em julho deste ano.

Todo ano, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) publica esse relatório, que reúne dados e estatísticas sobre a atuação da Justiça do Trabalho no ano anterior.

Os números não mentem

O gráfico abaixo representa os processos solucionados no ano de 2022:

Esses números demonstram que:

1- A Justiça do Trabalho está atenta à técnica dos Advogados

12,2% das ações nem sequer chegaram a ser julgadas.

Parte dessas extinções pode ser atribuída à alteração da CLT, em 2017, passando a dispor, em seu artigo 840, que a Reclamação Trabalhista deve delimitar o pedido e não apenas os fatos, como era antes:

“Art. 840 – A reclamação poderá ser escrita ou verbal.

§ 1o Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante.

§ 3o Os pedidos que não atendam ao disposto no § 1o deste artigo serão julgados extintos sem resolução do mérito”.

Embora prevaleça a possibilidade de Reclamação Trabalhista verbal, a Lei agora exige a observância da forma, para o caso das Reclamações Trabalhistas escritas.

Depois da alteração legislativa, o reconhecimento das petições ineptas levou ao aumento de Ações extintas sem análise de mérito, indicando uma grande necessidade de adaptação dos advogados que militam em favor dos empregados, no que se refere à técnica processual.

Isso mostra, também, que a Justiça do Trabalho está atenta à técnica processual, caindo por terra o mito de que o empregado tem sempre razão.

2 – Em 41,6% dos casos, a defesa das empresas foi acatada 

O advogado é o primeiro Juiz da causa e os profissionais que trabalham com essa premissa em mente, são os que mais entregam resultados aos clientes, evitando, assim, a propositura de Ações manifestamente improcedentes ou com pedidos muito maiores do que o real Direito do cliente, seguindo a máxima das aventuras jurídicas: “pedir o mais para ganhar o menos”.

Por muito tempo, a Justiça do Trabalho suportou esse tipo de atuação sem maiores prejuízos, até mesmo em virtude da desnecessidade de delimitação dos pedidos, na inicial.

Hoje, a quantidade de Ações julgadas com procedência parcial demonstra a utilização do princípio do ‘in dubio pro operario’, pelo julgador, com fins exclusivamente hermenêuticos.

Isto é: ao se deparar com dispositivo legal que permite mais de uma interpretação, o julgador deve adotar a que for mais benéfica ao trabalhador. 

No que se refere às provas, contudo, não há proteção irrestrita ao trabalhador, pois, se for dele o ônus da prova, as consequências de não produzir determinada prova serão por ele suportadas.

Nesse sentido, decidiu o Tribunal Superior do Trabalho:

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017. 1. DANO MORAL. PROVA DIVIDIDA. ÔNUS DA PROVA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. 

I. O entendimento desta Corte sobre a matéria é no sentido de que, constatada a existência de prova dividida, a presunção da veracidade dos fatos alegados milita em desfavor de quem detém o ônus da prova.

II. O julgador regional que, diante da prova dividida, decide em benefício da parte que teria o ônus de provar o fato constitutivo do seu direito, viola o art. 818 da CLT. III. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (TST – RR: 107199420145150135, Relator: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 03/05/2022, 4ª Turma, Data de Publicação: 06/05/2022)

Ainda de acordo com o gráfico, o percentual de Ações julgadas procedentes é ínfimo (7,4%), diante do percentual de Sentenças com procedência parcial (30,4%) e com improcedência (11,2%), demonstrando a atenção dos julgadores da justiça especializada, às provas produzidas nos processos.

Esse percentual indica o acolhimento da defesa das empresas em 41,6% dos casos, representando um índice altíssimo, considerando que 38% dos processos terminam em acordo.

Conclusão

A consulta aos julgados mais recentes do Tribunal Superior do Trabalho somente confirma o que o gráfico diz: a Justiça do Trabalho não protege o trabalhador de forma irrestrita.

Apesar da alta litigiosidade dos assuntos levados a julgamento, o que se pode concluir é que a Justiça do Trabalho continua sendo uma justiça social e democrática, mas que tem se tornado cada dia mais técnica, sem pender para um dos lados da balança, pois se isso ocorresse, não haveria isonomia na prestação jurisdicional, rompendo com a segurança jurídica e com a própria credibilidade da justiça especializada.

E algumas dessas decisões desfavoráveis devem, a longo prazo, causar nos advogados que militam na Justiça obreira, em favor dos reclamantes, uma mudança de posicionamento, no que se refere à análise do Direito e à formulação dos pedidos.

De outro lado, esses números precisam ser divulgados no meio empresarial, não para encorajar o descumprimento de obrigações trabalhistas, mas para mostrar que uma boa defesa, feita com técnica e com a correta análise das provas, tem, na Justiça do Trabalho, a mesma chance de ser acatada que tem nas outras justiças.

Conferir proteção ao trabalhador não é o mesmo que conferir vantagem incontinente, pois ao invés de promover-se a igualdade jurídica entre as partes, estaríamos pendendo a balança para um dos lados, rompendo com a isonomia da prestação jurisdicional e, principalmente, com a segurança jurídica do ordenamento.

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